Acampanha para provar que o
Brasil é um país racista não
esmorece. Há uma semana, o
IBGE divulgou pesquisa sobre
emprego e raça, e os jornais concluí-
ram que os dados "comprovavam" que
os negros são discriminados no mercado de trabalho. Foi um erro, um passo
além do que os números permitiam dizer. A pesquisa revelou que os negros
— a soma de pretos e pardos — são a
maioria dos desempregados, têm as
piores ocupações e ganham a metade
do salário dos brancos (essa ficção,
quem é branco no Brasil?). Mas nada
no estudo permitia dizer que os negros
estão nessa condição porque o Brasil é
racista ou porque os brancos são racistas ou porque os empregadores discriminam os negros. A pesquisa não mostrou, porque isso seria impossível, que
um engenheiro negro ganha metade do
que ganha um engenheiro branco. Ou
que um porteiro branco recebe o dobro
do que recebe um porteiro negro. Como já mostrei em artigos anteriores, os
negros vivem essa situação porque são,
na maioria, pobres e, como todos os
pobres, tiveram acesso a escolas piores, a um ensino deficiente. Sem estudo, não há trabalho, não há emprego,
não há bons salários.
O governo, no entanto, em vez de
concentrar esforços para elevar a qualidade de ensino no Brasil e para dar escola de bom nível a todos os pobres,
sejam brancos, negros ou pardos, parece preferir colocar a culpa nos brasileiros brancos. É, sem dúvida, uma solu-
ção simples: tira a responsabilidade de
si próprio, faz crescer um sentimento
de culpa nos brancos, leva os negros a
culpar os brancos pelas condições em
que vivem e a agradecer ao governo o
favor de denunciar a situação. Mas não resolve
o problema, e pode criar
outros, tão ou mais sé-
rios: o ódio racial, sentimento que até aqui desconhecíamos, e demandas impossíveis de atender. Daqui a pouco, anotem, haverá quem proponha uma lei estabelecendo aumento salarial
de não sei quantos por
cento aos negros para
que a distorção salarial
seja sanada. Para parecer sensata, a
proposta será de pequenos aumentos
anuais por um prazo de x anos, até que
negros e brancos ganhem salários
iguais. Se os negros no Brasil ganham
menos porque são discriminados, nada
mais correto do que corrigir a situação
por decreto.
Não, nada é simples. O mal deste
país não é o racismo. Ele existe aqui,
como em todo lugar, mas, entre nós,
nem de longe se transformou na marca
de nossa identidade. Sempre nos orgulhamos do nosso ideal de nação, um
país de miscigenados, em que o pró-
prio conceito de raça faz pouco sentido. A Grã-Bretanha está em meio a uma
campanha para que os britânicos se
aceitem como uma nação multiétnica:
no metrô de Londres, há cartazes em
que se vêem uma jovem muçulmana
envolta num véu feito da
bandeira nacional, um
negro com um boné de
rapper também nas cores da bandeira, um asiá-
tico com um aplique na
roupa nas mesmas cores
e um branco com uma
bandeira simulando uma
mochila. Todos britânicos, mas sem mistura.
Uma nação multiétnica,
portanto.
Até há pouco, os brasileiros riríamos dessa
iniciativa. Querendo deixar o racismo
para trás, os brancos britânicos se esforçam ao menos para acolher como
concidadãos pessoas de outras raças,
desde que não se misturem. Os que vê-
em o Brasil como racista querem dar
dois passos atrás. Não nos reconhecem
nem como a nação miscigenada que
sempre quisemos ser, nem como uma
nação multiétnica, com uma infinidade
de cores, cafuzos, mamelucos, mulatos,
brancos, pardos, pretos. Querem-nos
uma nação bicolor, apenas negros e
brancos, com os brancos oprimindo os
negros. É triste.
O nosso problema não é o racismo,
mas a pobreza e o modelo econômico
que, ao longo dos anos, só fez concentrar a renda: os que eram pobres — e
os negros, ex-escravos, por definição
foram os despossuídos da nação —
permaneceram pobres ou ficaram mais
pobres; e os que eram ricos, ricos ficaram ou enriqueceram ainda mais. O
Brasil deveria estar unido para resolver
esse problema, distribuindo renda e investindo maciçamente em educação.
Quando os pobres deste país tiverem
uma educação de qualidade, todos terão a mesma chance no mercado de
trabalho. E as distorções entre brancos
e negros terão um fim. Em vez disso, o
governo só busca saídas paliativas: não
faz nada para garantir boa educação,
mas cria cotas, para que os negros entrem na universidade, sem o preparo
devido, o que, muito provavelmente,
não fará deles profissionais competitivos e aumentará a frustração.
PS: Segundo o IBGE, 49,2% dos desempregados são brancos e 50,4%, negros, praticamente um empate. Dizer que isso é a prova de que há racismo no mercado de trabalho
é algo que entendo como fraude.