A
que se destina uma política
de cotas raciais nas universidades? Facilitar o acesso
de negros aos bancos escolares de nível superior, dizem os defensores das cotas. Mas será que as
portas do ensino superior estão
mesmo fechadas para negros?
Não me oponho a que se defenda
tal política, mas cobro clareza,
transparência e honestidade intelectual. É preciso que os cidadãos brasileiros conheçam a questão em todos os seus ângulos para que possam julgar se o remédio está certo
ou errado ou mesmo se há algum remédio a ser prescrito.
Tive acesso a uma pesquisa feita
pelo Ministério da Educação entre os
estudantes de nível superior que se
submeteram ao chamado "provão".
Os resultados são surpreendentes:
4,4% dos alunos de universidades federais se declararam negros, sendo
que a população de negros no país é
de 6,2%, segundo o Censo de 2000 do
IBGE. Nas universidades estaduais, o
número é mais expressivo: os que se
declaram negros são 5,5%. Os pardos
são, nas federais, 30,3% e, nas estaduais, 30,5%. A população brasileira
que se declara parda é de 39%, também segundo o Censo. Onde está a
gritante defasagem?
A pesquisa ganha ainda mais importância quando se atenta para um
detalhe: ela foi feita entre os 390 mil
alunos, de 26 áreas, que estavam cursando o último ano de estudos, quando estão prestes a se
formar. Portanto, ela é
o retrato da situação de
negros e pardos depois
de todos os gargalos.
Em outro artigo, eu já
tinha desfeito um engano. Toda a política de
cotas é baseada na suposição de que os negros, apesar de serem
45% da população,
eram a imensa maioria
entre os pobres, 64%.
Mas isso é um duplo engano. Na verdade, os negros são 7%
dos pobres e 6,2% da população. Os
defensores das cotas só chegam
àqueles números dilatados porque
somam os números de pardos aos
números de negros e, sem explicar
por quê, chamam a todos de negros.
Assim, somando-se os 7% de negros
pobres aos 57% de pardos pobres,
chega-se aos tais 64%.
Da mesma forma, somando-se os
6,2% dos negros aos 39% dos pardos,
chega-se ao número geral de 45%.
Mas na hora de se beneficiar das cotas, os pardos são excluídos. Assim
como os 19 milhões de brancos pobres, 36% do total. Só os negros terão
direito às cotas.
Alguns leitores disseram que eu estou enganado, porque os pardos podem muito bem
ser definidos como
afro-descendentes, o
que justificaria a soma
de pretos e pardos.
Bastaria, então, que a
medida provisória que
permitirá a adoção de
cotas não fale em negros, mas em afro-descendentes para que as
injustiças sejam postas de lado. Parece razoável? Nem um pouco.
Chamar um pardo de afro-descendente é mais do que inapropriado, é
errado. Tenho uma amiga cujo pai é
negro assim como todos os ascendentes dele. A mãe é italiana, assim
como todos os ascendentes dela. Como chamá-la apenas de afro-descendente? Por que lógica? Se alguma ló-
gica existe, o correto seria chamá-la
de ítalo-afro-descendente ou afro-ítalo-descendente, como preferirem. E
como todos os pardos são, na origem, fruto do casamento entre brancos (europeus) e negros (africanos),
os pardos deveriam ser genericamente chamados de euro-afro-descendentes. Teriam, ainda assim, direito a cotas ou o prefixo "euro" os
condena irremediavelmente? Se tiverem, o governo terá dificuldade de
explicar à legião de 19 milhões de
brancos pobres por que eles, somente eles, ficam fora do benefício.
Falando assim, tão cruamente,
pretendo deixar claro como todas
essas definições são em si racistas.
Porque não devemos falar em negros, pardos ou brancos, mas apenas em brasileiros. E como parece
justo e republicano, não devemos
beneficiar ou prejudicar cidadãos
em função da cor de suas peles. Os
recursos do país devem ser usados
em benefício de todos os cidadãos e
dos mais pobres especialmente. De
todas as tonalidades